Nubá - Liberdades Possíveis

Prefácio
Pelo prisma histórico, muito poderia ser dito sobre o cenário no qual se desenrola esta obra de ficção. Os materiais de estudo necessários para a composição do panorama da época é vasto e ao escolher quaisquer dos aspectos (cultural, econômico, geográfico...) se encontrariam fontes para pesquisa das mais variadas e abundantes. E mesmo limitando-se a falar superficialmente sobre qualquer um dos assuntos poderia se criar uma longa dissertação, cheia de parênteses, reticências e interrogações, conclusivas ou não.
Embora em momento algum o livro traga a data precisa dos acontecimentos imaginados, deduz-se logo em que época ocorreram. Sabendo-se então como estes anos foram determinantes para a formação da nossa sociedade e das peculiaridades do nosso povo tanto aqui no Brasil quanto na África, pode-se concluir erroneamente que este material possa ser de alguma utilidade como referência às realidades da era do Brasil - colônia quando o trabalho escravo e o tráfico de negros africanos atingiam o seu apogeu, ou mesmo que possa trazer à luz algum novo elemento que acrescente alguma informação àquilo que já se sabe sobre as menores tribos africanas. Previno desde já que nenhuma dessas possibilidades procede. Pelo menos não diretamente. Digo isso em respeito àqueles que buscam algum outro tipo de literatura que seja de caráter essencialmente informativo, e afirmo sem receios de parecer displicente que neste trabalho especialmente me abstive de grandes compromissos com as verdades históricas ou mesmo geográficas. Inclusive, notar-se-á logo nos primeiros capítulos que estes aspectos são meras pinturas incorporadas ao cenário e ficam em segundo plano.
O que me moveu a escrever as primeiras páginas deste conto – como eu o imaginava no início – foi o sentimento de amizade, e seria principalmente sobre isso que deveria tratar. Porém à medida que a trama ia se desenrolando, outras personagens surgiam, inspirando sentimentos de amor, esperança, fé e dúvida. Devido também a uma situação em que se vêem envolvidas as personagens durante grande parte da história, ela pode em alguns momentos parecer resumir-se na saga de um povo para recuperar sua liberdade, o que sinceramente não me desagrada, apesar de desviar um pouco o foco da idéia original. De qualquer maneira, o texto nunca se afasta tanto de seu centro que chegue a escapar da arena que lhe é reservada: a dos sentimentos humanos. Pois também neste caso é aí que estão os contrastes, as nuanças que pretendo realçar e colorir ou mesmo cobrir de cinza algumas vezes. Pois mesmo quando são descritas em algumas passagens paisagens de mares, desertos, florestas, céu, é para dentro que o olhar se dirige. E o que se vê por fora e ao redor é sempre um medo, uma saudade, uma esperança. Como paisagens interiores refletidas diante dos olhos. É esse o ângulo que prefiro; ainda que o formato do livro seja objetivo e simples e permita que você leitor, aprecie-o da maneira que lhe sugira sua própria sensibilidade.
Obviamente uma história como esta que lhes apresentarei, não poderia ocorrer de forma idêntica nos dias atuais, mesmo assim ela nos traz situações, questionamentos e idéias muito comuns ao nosso cotidiano. Desta forma cria-se uma dúvida: se nem a data (no caso, as primeiras décadas do século XVII) e nem o local (lugares desolados na mata do litoral brasileiro e em menor escala a costa oeste do continente africano) são fatores determinantes para a caracterização de cada personagem, então por que ambientar toda a trama em anos tão remotos?...Bem, a resposta é irritantemente simples: “Porque assim o quis a inspiração!”
É certo que para mim seria mesmo muitíssimo mais fácil encaixar todas as idéias abordadas em uma narrativa moderna bem ao estilo contemporâneo, já que como mencionei antes, a tônica do livro está – ou pelo menos deveria – em alguns instintos e sentimentos atemporais. Infelizmente me foi impossível abandonar aquele primeiro impulso, aquela primeira visão, e acredito que não irei arrepender-me por isso. Mas, se de qualquer maneira, os ideais de “Nubá” o jovem guerreiro africano não forem em nenhum momento concernentes aos anseios do rapaz suburbano de nossos dias, ou se “Malika” esta bela negra apaixonada e indomável, não apresentar traços de sua personalidade nos modos de alguma estudante de descendência alemã do interior do Rio Grande do Sul, ou se ainda o menino de feira Joaquim não tiver semelhança alguma com o pré-adolescente que anda de skate pelas calçadas de São Paulo; enfim, se nada houver nessas páginas que ecoe, mesmo que fracamente no mundo em que vivemos hoje, então será correto concluir que não somente o livro está aquém de seu tempo, mas também, e principalmente, o próprio autor.
Torço para que esta leitura te toque, te envolva, te enterneça. Ou que seja pelo menos, uma boa distração. Boa Viagem! Elivelto Corrêa.

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